No cenário atual, cresce a consciência de que lideranças autoritárias e unilaterais já não têm mais espaço em ambientes que valorizam a colaboração e a liberdade de expressão. Em seu lugar, ganha força uma abordagem mais humanizada e conectada, onde a segurança psicológica deixa de ser um diferencial e passa a ser uma necessidade.
Esse movimento reflete diretamente no cotidiano das equipes, como revela uma pesquisa do Talenses Group, realizada em 2024, na qual 90% dos entrevistados, em um universo de 590 pessoas, afirmaram já ter convivido com líderes tóxicos. Somam-se a isso práticas que, muitas vezes, não começam de forma explícita, mas se desenvolvem silenciosamente ao longo do tempo: os assédios no ambiente de trabalho. Dados recentes da Justiça do Trabalho mostram que, entre 2020 e 2023, o número de processos julgados por assédio sexual cresceu 44,8%, enquanto os casos de assédio moral tiveram aumento de 5%.
A ausência de uma liderança humanizada, comprometida com a segurança psicológica, teve um impacto direto e profundo na minha trajetória. Sou mulher, mãe, esposa e, sobretudo, uma profissional que precisou se moldar para sobreviver em ambientes corporativos predominantemente masculinos. Desde cedo, aprendi a silenciar diante de agressões e a ajustar minha postura e discurso para ser levada a sério. Transformei minha vida em um grande projeto: planejei a gestação, os fins de semana, o tempo com os filhos, tudo cronometrado. Por fora, eficiência. Por dentro, um desequilíbrio crescente. Apesar dos resultados expressivos e das conquistas profissionais, fui, aos poucos, afastando-me de mim mesma, da minha essência, do meu feminino, dos meus próprios limites.
Enfrentei episódios de violência psicológica e física, tive denúncias de abuso ignoradas, fui rebaixada injustamente após a maternidade e pressionada a escolher entre minha saúde e minha família. Em meio a tantos desafios, também vivi conquistas: encontrei lideranças que valorizavam a diversidade, participei de projetos inovadores e fui reconhecida por defender princípios éticos. Mas o custo emocional foi alto. A gota d’água veio com um acidente de carro, causado pelo esgotamento extremo, que revelou uma nova gravidez e, tragicamente, a perda dela. Meu corpo gritava o que a mente já não conseguia mais esconder: algo estava errado.
Após o Burnout – doença reconhecida e classificada pela Organização Mundial da Saúde (MS) como ocupacional – e outras experiências dolorosas, compreendi que nenhum sucesso justifica a perda de conexão com quem se é de verdade. Aprendi, com cicatrizes e silêncio, que respeito, saúde e propósito não devem ser colocados à venda. Hoje, sigo mais atenta aos meus próprios valores, consciente de que, às vezes, mudar de rota é a única forma de preservar a sanidade.
Minha história é apenas uma entre tantas que ilustram por que cada vez mais profissionais pedem demissão – não por falta de capacidade ou oportunidades, mas para preservar a saúde mental. Nesse contexto, é urgente romper com modelos de liderança autoritários. Líderes que priorizam a humanização e a segurança psicológica se tornam facilitadores, orientam com clareza, distribuem responsabilidades com equidade, constroem vínculos de confiança e praticam a escuta ativa. Mais do que comandar, inspiram colaboração e criam ambientes em que as pessoas se sentem respeitadas, valorizadas e verdadeiramente ouvidas.
Uma liderança eficaz exige mais do que estratégia e pensamento crítico, requer comunicação clara e relações baseadas na confiança. Feedbacks bem conduzidos são essenciais para impulsionar o desenvolvimento das equipes, mas é preciso ir além, uma vez que liderar com humanidade significa estar junto da equipe, não acima dela.
Por fim, valorizar uma cultura não punitiva traz benefícios diretos para a equipe e, por consequência, para toda a organização. Quando os profissionais não se sentem em constante estado de “sobrevivência”, mas reconhecidos como parte essencial do time, há espaço para que a criatividade floresça.
A seguir, quatro aspectos essenciais para promover uma liderança humanizada e um ambiente de segurança psicológica nas organizações:
– Incentivo à liberdade de expressão – ambientes seguros valorizam opiniões, erros e contribuições sem medo.
– Rompimento com o autoritarismo – liderar é ouvir, orientar e construir confiança, não controlar.
– Cuidar da saúde mental e social – é preciso respeitar limites e promover equilíbrio entre vida e trabalho.
– Estímulo a uma cultura não punitiva – erros são parte do aprendizado.
*Precursora do conceito de segurança psicológica no Brasil, a psicóloga organizacional Patricia Ansarah – com mais de 20 anos atuando em RH e como executiva de grandes empresas – criou o instituto para endossar o pioneirismo e dar visibilidade ao tema no Brasil e levar soluções integradas por meio da segurança psicológica para o desenvolvimento de times e organizações.
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BARTIRA BETINI NUNES
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