A eleição presidencial dos Estados Unidos de 2024, com a vitória de Donald Trump, reafirma um cenário de distanciamento e pragmatismo nas relações entre Washington e a América Latina. A região permanece secundária nas prioridades estratégicas dos EUA, enquanto o discurso migratório, novamente centralizado, enxerga os fluxos de latinos como ameaças à segurança nacional e ao mercado de trabalho americano. A imigração continua sendo tratada como uma questão de segurança, o que projeta os latinos como um “inimigo interno”, reforçando barreiras e políticas restritivas.
Nenhum presidente americano visitou a América Latina em mais de uma década, exceto para participar de encontros multilaterais, que não substituem a diplomacia de visitas bilaterais ou de Estado. Desde a visita de Obama, em 2012, a região se mantém fora do radar de Washington, sem uma estratégia robusta de cooperação. No lugar de uma política de desenvolvimento compartilhado, a América Latina é vista principalmente como fonte de desafios a serem contidos, como imigração indocumentada, tráfico de drogas e violência.
Com o aumento da desigualdade e da violência urbana na região, os fluxos migratórios para os EUA continuam a crescer. Milhares de famílias buscam melhores condições de vida, atraídas pelo “sonho americano”, que se mantém como uma esperança distante para muitos. Contudo, a resposta dos EUA se traduz no fortalecimento das políticas de fronteira, construção de barreiras e deportação. Em vez de abordar as causas fundamentais da migração, a política americana foca em limitar o ingresso de quem busca alternativas para escapar da pobreza ou insegurança.
Com a confirmação de Marco Rubio como Secretário de Estado, o governo Trump busca legitimar a política de deportação em massa ao designar um latino como principal representante das relações exteriores americanas. Essa estratégia visa obter respaldo doméstico e internacional para políticas rigorosas de controle migratório, utilizando a identidade do Secretário como legitimador dessas diretrizes. Porém, não será apenas no campo da imigração que a América Latina estará sob o radar secundário do governo Trump.
Nas relações com o Cone Sul, a Argentina deverá desempenhar um papel importante, já que o presidente eleito Javier Milei tende a se aproximar do governo e do próprio Donald Trump, em uma tentativa de alinhamento automático e pouco questionador. Esse cenário pode abrir espaço para que interesses econômicos e empresariais de figuras como Elon Musk encontrem na Argentina um ambiente favorável, potencialmente promovendo agendas estratégicas do empresário, travestidas de uma agenda do governo americano e sob a aparência de políticas domésticas e regionais da Argentina.
Para a América Latina, o distanciamento diplomático e o tratamento da imigração como uma questão de segurança indicam o papel limitado que Washington reserva à região. O custo dessa abordagem, financeiro, ético e diplomático, poderá aumentar com o tempo, sem que uma resposta colaborativa seja formulada para enfrentar o movimento migratório de maneira mais eficaz e sustentável. A abordagem de conter apenas a oferta migratória, desconsiderando a demanda, revela-se limitada e potencialmente onerosa a longo prazo, como ensina o próprio capitalismo americano.
*Guilherme Frizzera, professor de Relações Internacionais da Uninter e doutor em Relações Internacionais pela UnB
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JULIA CRISTINA ALVES ESTEVAM
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